THE HEAVY BLINKERS - THE NIGHT AND I ARE STILL SO YOUNG
Por Marina Nantes
A cidade fria, o asfalto cinza e assimétrico, a fumaça dos carros. Mas a canção dizia "filtered light from morning sky..." e tudo isso desapareceria por 3minutos. Uma sensação inigualável. Então me dei conta que mesmo nos momentos emque não encontrasse nada belo por perto poderia olhar para o alto, apertar o play e mergulhar num céu quase azul. "The Night and I...", disco lançado no ano passado, emana toda essa certeza e energia do grupo canadense. Se vocês não existissem Blinkers, hoje eu estaria perdida. Porque "Silver Crown" e o eco daquele refrão envolvente parecem tocar minha alma como uma oração. E como sou uma discípula devota: "Try tell that to my baby", "Mother Dear" entre outrastambém são louvadas.
Sintonize-se com mais esse apaixonante disco, que se tocasse na rádio, ouçodizer que a raça humana nem precisaria de religião. Sem tristezas, teríamos no que acreditar, afinal esse sunshine pop é uma viagem para a terra prometida. Com um bilhete só de ida, claro.
A Entrevista
Orchestral sunshine pop brotando nas terras de Halifax, Nova Scotia. Uma sintaxe inspiradora como "Filtered light from morning sky / Lift your head and open wide/ Your eyes renewed". The Heavy Blinkers resgata a puerilidade e filosofia de outrora em mais um disco essencial. Da cosmo visão de uma ouvinte surgiu o desejo de conversar com Jason MacIsaac.
E como era de se esperar, Jason, vocalista e guitarrista no quinteto canadense atendeu nosso pedido e fala sobre o novo álbum e trajetória dos Blinkers.
1. Power Pop Station: Toda vez que ouço The Heavy Blinkers eu confirmo aquela atmosfera mágica e nostálgica e ao mesmo tempo profundamente reveladora de novos sentidos para amúsica atual. Enfim, como tudo isso começou?
Jason MacIsaac: Na década de 90 fazia parte de um quarteto parecido com Pixies. Estava morando em Toronto e me lembro conversar com minha irmã a respeito de querer formar uma banda com vocal feminino e talvez com cordas e theremin. Estava cansado de distorções e guitarras. Foi quando me mudei para Halifax e montei o projeto TheHeavy Blinkers. Comecei a gravar sozinho. O engenheiro de som era Andrew Watt. Ele adorou a música e começou a se envolver, saindo daquele cenário estritamente profissional. Simultaneamente, Andrew estava gravando uma banda power-pop cujo baterista era o Greg Fry. Chamei também um velho amigo para tocar baixo em algumas canções, Trevor Forbes, e pedi para Ruth Minnikin cantar em algumasfaixas. Quando tive que tocar ao vivo, recrutei os artistas mencionados e estivemos juntos desde então. Em 2004, chamamos David Christensen que já compunha para os Blinkers para ser um integrante definitivo, e assim chegamos ao sexteto que vocês conhecem hoje.
2. PPS: Fale a respeito da produção e gravação do quarto álbum, "The Night and I arestill so Young". O resultado foi um tanto impressionante e arrisco dizer que provavelmente mais maduro do que os discos anteriores. Existe tal sentimento de realização com esse trabalho, uma espécie de marco na carreira dos Blinkers?
J. M.: THE NIGHT AND I... foi gravado num celeiro no interior. Em uma área rodeada de pássaros, ovelhas e gatos e onde o estúdio foi convertido num barco-casa. Ter a natureza tão perto foi uma inspiração constante e isso se traduz no conteúdo da produção. Também acredito que seja o melhor álbum até agora. No entanto, o novo trabalho, entitulado HEALTH (a ser lançado na primavera desse ano) é de longe nosso melhor disco. Será um disco duplo exibindo um toque Sondre Lerche, TheHigh Llamas e muitos outros.
3. PPS: Aquela idéia para o video clipe de "Try Telling That to My Baby" foi sua? Em que doces e guloseimas animados dublam a já açucarada canção?! (Para os internautas, o vídeo pode ser encontrado no You Tube.)
J.M.: Infelizmente, a idéia não foi minha, foi de uma produtora de vídeo chamadaFluorescent Hill. Recentemente, fizeram um vídeo para o Badly Drawn Boy e nós entramos em contato com eles. Eu particularmente não gosto dessa associação com dias ensolarados, ou doces ou o que seja, um pouco como Monkees trabalhando uma 'imagem fabricada'. Mas de qualquer forma, o vídeo ficou incrivelmente divertidoe um clipe adorável de psicodelia. Pode algo ser adorável e psicodélico ao mesmotempo?
4. PPS: Sem dúvida que a voz doce de Ruth Minnikin exala um baroque-folk ingenuamenteidealístico sobre as composições do Heavy Blinkers encorpando o tom esperançoso e apaixonante. Como vocês se conheceram?
J.M.: Você é uma boa observadora! Ruth é uma cantora folk com três álbuns independentes lançados. Gosto de contraste realístico de sua voz com os arranjos orquestrais que produzimos. Parece Nico fazendo These Days de Jackson Browne. Sempre fui fã de Ruth Minnikin, então pedi para ela cantar no Blinkers e o resultado foi mágico.
5. PPS: De que forma artistas como Brian Wilson, Phil Spector e Burt Bacharach moldaram seu estilo de compor e tocar?
J.M: Certamente, você mencionou a tríade sagrada da música pop. A música de BrianWilson me ensinou sobre saturação e vozes e coros não convencionais. Acho que Kiss me Baby é a perfeição musical. Phil Spector me lembra da importância da interação ao vivo entre as pessoas. Na era em que escutamos faixas a um clique do mouse ou produzimos discos no ProTools, é bem fácil se esquecer do valor da energia de um grupo em cima do palco. Agora, Burt Bacharach, ele é simplesmente o melhor, não é? Suas composições são exercícios de teorias, mas soam orgânicas e fluem de uma maneira leve. Não são tão carregadas de emoção quanto as de BrianWilson, mas são sofisticadas ao gosto de Gerswhin ou Kurt Veil.
6. PPS: Quão profundas são as canções? Em outras palavras, talvez o conceito de "arte pela arte" prevaleça, ou elas realmente tentam comunicar algumas buscas espirituais, dinamizando a experiência sonora?
J.M: Apenas tento chegar ao nível máximo de poesia sem perder a emoção. Mesmo que eu não conte estórias lineares sobre amor e felicidade, tento incorporar elementos de tais experiências na minha escrita. Mas às vezes, simplesmente é pra ser"baby baby, I miss you dooby dooby dooo". Se as letras da Motown tivessem sido mais esotéricas, elas provavelmente não seriam tão adoradas como são hoje.
7. PPS: Vocês pensam em conhecer terras mais quentes e tropicais como o Brasil? Pois saibam que vocês têm fãs desejosos de alguns shows... Se vocês tivessem nascido por aqui, Jason, como imagina ser o som dos Heavy Blinkers versão tupiniquim?
J.M.: Adoraria ir ao Brasil, uma vez quase fomos mas não deu certo. Busco grande inspiração em Tom Jobim e Tropicália e seria um sonho tocar por aí. Se os Heavy Blinkers tivessem começado no Brasil, seríamos praticamente os mesmos, mas numa dieta rica em Mutantes, provavelmente um pouco mais psicodélicos, um pouco menos dóceis, talvez no próximo álbum.
8. PPS: Uma canção dos anos 60 ou 70 que continua fresca e relevante.
J.M.: THE LOOK OF LOVE do Burt Bacharach cantada por Dusty Springfield. Tem todos os elementos para procurar em uma boa canção pop e nessa era de artistas pseudo-jazz, é bom lembrar como um dia tudo isso foi.
9. PPS: Uma canção que mudou seu olhar sobre o mundo.
J.M.: Difícil responder essa. Me lembro da primeira vez que ouvi "I guess I just wasn't made for these times" dos Beach Boys ou "the river" do Bruce Springsteen,"Natasha" do Rufus Wainwright. Momentos em que congelei diante do poder da arte.
10. PPS: Um álbum injustiçado dos anos 60 ou 70 que simplesmente adora.
J.M.: Existem centenas de discos... Marlena Shaw-the spice of life, From Elvis in Memphis, The Tokens-intercourse, Madeline bell-bells a poppin', The Everly Brothers-roots, Skip Spence-Oar, Gal Costa-Gal Costa, The Monkees-instantreplay, Françoise Hardy-la question, Mike Nesmith and the First nationalband-magnetic south, Van Dyke Parks-discover america, The Beach Boys-Holland, Fleetwood Mac-Tusk...
11. PPS: Um álbum que poderia muito bem ser a trilha sonora da sua vida.
J.M.: Joanna Newsom-YS. Me inspira a escrever e sempre encontro algo novo nele.
12. PPS: Um filme para o qual os Heavy Blinkers poderiam ter feito a trilha sonora.
Teria adorado fazer a trilha para Eyes without a Face/Les Yeux Sans Visage de Georges Franju. Adoraria que os Blinkers fizessem a trilha de um filme de terror algum dia, e esse é um filme bem assustador, mas tem o lirismo e romantismo de um filme francês.
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